Sabe-se que as infecções hospitalares constituem grande risco à saúde dos pacientes internados em clínicas médicas e hospitais. Logicamente, estabelecimentos voltados à saúde igualmente estão expostos, eis que questionamentos advirão caso o risco se confirme. Com a saúde dos dois lados “em jogo”, imprescindível é o desenvolvimento deliberado e sistemático de ações para a redução máxima possível da incidência de infecções hospitalares. Uma “boa” e “eficaz” resposta aos eventuais e futuros questionamentos disso dependerá.
O controle da infecção hospitalar é, no dizer de Berlinguer (Bioética da Prevenção, Bioética, 2:117-22, 1994), a capacidade de intervir com o escopo de evitar danos, impedindo a disseminação de moléstias e agentes infecciosos por meio de normas de isolamento e reduzindo riscos de infecções cirúrgicas mediante o uso de antibioticoprofilaxia. Nesse sentido e consequentemente, médicos, diretores de clínicas e hospitais, enfermeiros, biólogos, farmacêuticos, atendentes, administradores (de hospitais e de clínicas) e especialistas em epidemiologia hospitalar devem estar envolvidos.
Tal controle deve ter atuação preventiva e ser mantido nos hospitais e clínicas de todo o País, pois a medicina existe para assegurar a saúde, regendo-se pelo princípio primum non nocere (primeiro não prejudicar), que tem por finalidade primordial reduzir os efeitos indesejáveis das ações diagnósticas e terapêuticas em seres humanos, buscando sempre soluções que possam trazer benefícios aos pacientes envolvidos.
Em apertada síntese, ao encontro da doutrina especializada, eis algumas medidas em prol do controle da infecção hospitalar e, como já dito, dos estabelecimentos voltados à saúde:
- Aplicação de recursos para aquisição de equipamentos preventivos;
- Distribuição equilibrada de recursos para atingir o maior número possível de pacientes envolvidos;
- Proteção do bem-estar do paciente, bem como de sua privacidade, mantendo-se sigilo sobre seu estado e não constando seu nome em relatórios a serem divulgados (também em sintonia com a LGPD);
- Adoção de medidas preventivas ou de rotinas técnico-operacionais para prevenção e controle de infecção hospitalar, visando limitar a disseminação de agentes presentes na infecção;
- Investigação de surtos de infecção, implantando medidas imediatas de controle;
- Comunicação feita de modo claro aos demais profissionais da saúde dos resultados obtidos em relatórios enriquecidos com explicações objetivas e gráficos;
- Racionalização do uso de antibióticos, antimicrobianos ou germicidas, empregando o menos tóxico, ajustando-os em doses conforme a gravidade e o parâmetro fisiológico do paciente, para reduzir germes resistentes a múltiplas drogas, pedindo, se possível, a opinião de um farmacologista clínico sobre as consequências das interações com outras drogas ou do mesmo antimicrobiano e o sistema imunológico do paciente;
- Notificação às autoridades das enfermidades ocorridas;
- Proteção da saúde dos colaboradores da clínica ou hospital, impedindo a disseminação de agentes infecciosos multirresistentes, mediante sua vacinação, por exemplo, contra hepatite B, rubéola, tuberculose etc;
- Cautela conforme o tipo de cirurgia a ser desenvolvida, a gravidade da enfermidade atendida ou do caso, o grau de comprometimento orgânico, a idade do paciente etc;
- Adoção de medidas de isolamento de doentes com moléstias contagiosas;
- Lavagem e antissepsia das mãos e uso de barreiras físicas, ou seja, luvas ou máscaras, para impedir a exposição dos fluidos biológicos liberados durante o procedimento invasivo;
- Sendo hospitais, criação de Comissão de Controle de Infecção Hospitalar (CCIH), órgão de assessoria à autoridade máxima da instituição e de exercício das ações de controle de infecção hospitalar;
- Escolha de sistema fechado de coleta de urina, líquor ou líquido peritonial;
- Opção por um tipo de cateter, curativo ou antisséptico mais aconselhável com vistas ao combate à infecção hospitalar;
- Rigorosa e imperativa observância em relação aos prazos de validade de produtos a fim de evitar nexo causal entre a infecção e a falha do médico/clínica/hospital;
- Implantação de um sistema de vigilância epidemiológica das infecções hospitalares;
- Treinamento permanente de funcionários e profissionais da saúde com vistas a obter capacitação adequada para prevenção e controle de infecções hospitalares.
As medidas acima qualificam a assistência dos estabelecimentos voltados à saúde (clínicas/hospitais), mas, por evidente, envolvem a vigilância sanitária dos Estados e Municípios. Nunca demais recordar que o Sistema Único de Saúde (SUS), regulado pela Lei nº 8.080/90, tem por escopo a assistência às pessoas por meio de atividades de promoção, proteção e recuperação da saúde, com a realização integrada de ações assistenciais e preventivas. De igual forma, os órgãos estaduais de saúde no exercício da atividade fiscalizadora deverão observar a adoção, pela instituição prestadora de serviços, de formas de proteção capazes de evitar efeitos nocivos à saúde dos agentes, clientes e pacientes (Dec. nº 77.052/76).
A convergência de propósitos e a assertividade das consequentes ações produzirão efeitos positivos. Enquanto prestadores de serviços, resta-nos fazer nossa parte. Compromisso de quem presta serviço à saúde, o controle de infecção hospitalar deve ser permanentemente lembrado a fim de conscientizar os profissionais da saúde de sua importância e fomentar campanhas para aumentar a consciência pública sobre os seus problemas.